domingo, 16 de dezembro de 2007

Contra o milagre

jcb




Os amieiros de Março, ainda sem as folhas do Verão, exibem as imagens pretéritas da enchente. As águas avançam nas margens do rio Beça, ocupam o leito de cheia, sobem os troncos das árvores, deixam nos ramos mais altos os seus anéis, pedaços de ervas secas, a aluvião da torrente.

Um rio vivo é assim que respira, correndo num talvegue desenhado pelo Tempo, imprevisível, único, irrepetível, carreando memórias na direcção do futuro.

Nenhum muro deveria ser erguido contra o milagre destas águas vivas.

6 comentários:

Anónimo disse...

Vivemos hoje uma era de globalização, mas é importante reconhecer que este fenómeno, sem dúvida actual, é também fenómeno do passado e futuro, como se pode concluir pela análise da história do homem e das civilizações. Encaremos a globalização como fenómeno cíclico na história. Recuemos até ao helenismo alexandrino, três séculos de transformações, crises e equilibrios, apenas aniquilado pela conquista romana. António Pedro Mesquita (univ. Coimbra), refere-se a este periodo como a "época da primeira globalização", e chama a atenção do homem moderno para algumas questões que se levantam com a ruptura que representa a "primeira globalização". Em que civilização se dá esta ruptura, que modo de consciência ela veio perturbar e alterar, e o que temos a aprender com as respostas a estas questões, são algumas propostas adiantadas. Sem querer entrar em detalhes históricos ou filosóficos, recorde-se apenas que o problema da relação entre o homem e o universo surge com a entrada no helenismo, quando o homem se começa a sentir "cidadão do mundo". Como no passado, também no presente e futuro a globalização é inevitável, tanto como inútil resistir à exploração, dominação e às injustiças sociais que advêm do sistema. Nos dias de hoje, observa-se uma crescente incapacidade de resposta dos grupos sociais explorados e dominados, perante o gigante económico transnacional e alargamento manipulatório. A biosfera vê-se progressivamente esmagada por uma tecnologia generalizada, predadora dos bens planetários, em nome do crescente império do capitalismo desenfreado. O sistema tecnológico é o meio de afirmação do processo neo-colonial, produzindo a des truição dos habitats e populações nativas. Aumenta a distância entre os grupos dominadores e o resto da sociedade. Assiste-se ao crescimento de regiões onde o esbanjamento dos bens comuns, se deve à devastação dos meios naturais na periferia. A concentraçao do poder dominante só é possivel graças à neutralização dos mais fracos que têm de se submeter, optar pelo absentismo e neutralidade e pelas soluções cómodas do irracionalismo.
R.M.Machado Da Silva

josé carlos barros disse...

Tudo muito certo. De quanto diz, retiro que nos devemos opor a essa «concentraçao do poder dominante» que só é «possível graças à neutralização dos mais fracos que têm de se submeter, optar pelo absentismo e neutralidade e pelas soluções cómodas do irracionalismo.» Ou seja: não ficar a dormir enquanto o «irracionalismo» avança. Certo?

Anónimo disse...

Certo. Também dezenas de milhar de pessoas assinaram petição contra a construção de uma barragem no Sabor, enquanto a imprensa local e nacional dava conta "(...)especialistas defendem a construção de barragens em todos os afluentes do Douro como única forma de controlar o caudal deste rio e evitar a ocorrência de cheias(...)" ou, "(...)municipios do Baixo Sabor encomendaram uma sondagem e pretendem levar o Governo a tomar uma posição favorável relativamente ao empreendimento(...)". Em posição contrária, a Plataforma Sabor Livre levou queixa à Comissão Europeia, queixa arquivada. Conclusão, a construção da barragem avança em 2008, e vai custar mais de 350 milhões de euros, se a memória não me engana. Da Constituição da Republica Portuguesa, interessa recordar para o caso, essencialmente o art.9º(alíneas d) e e)) e art.66º. Mas a revolução que restituiu ao povo os direitos e liberdades fundamentais, e o 2 de Abril de 1976, já lá vai... a memória é curta.
R.M.Machado da Silva

Anónimo disse...

Que podemos fazer? Que meios de luta?Que podemos realmente fazer, para impedir que estas aberrações, e outras, nos destruam as imagens mágicas e saudáveis da nossa terra, que guardamos na alma e no pensamento?
Que podemos fazer, nós que abandonámos a nossa terra para os ganasiosos e famintos do poder?
Há quem a tenha abandonado, para lutar e proteger outras.
Há quem lá vá, só para desfrutar das poucas boas coisas que ainda vão resistindo, graças ao povo que trabalha.
E depois...tudo fica por aí, ou numas simples e bonitas palavras, que como alguém disse um dia, há muito tempo:palavras, leva-as o vento.
Que podemos realmente fazer?

Anónimo disse...

Que podemos fazer, pergunta muito bem. Enviem-se arqueólogos, procurem-se pinturas paleolíticas. Ainda assim, existe o risco de um qualquer especialista em arte rupestre da UNESCO, considerar a melhor forma de preservar as gravuras seja através da submersão, evitando o risco de vandalismo... Haveria, contudo, um escândalo internacional.
Para o rio Sabor, espera-se que a intervenção divina salve o santuário de Santo Antão.
Invoquemos então, Navia, divindade lusitana dos rios, para que interceda pelo rio Beça.
Oremos, irmãos.
R.M.Machado da Silva

Anónimo disse...

Não a conhecia tão espiritual, Regis. Já não tem vontade de agitar bandeiras? Vim a este blog por sua indicação, infelizmente não tenho o prazer de conhecer a paisagem maravilhosa que descreve. Vamos à luta?
Tó Bé